há quinze anos, quando decidi fazer uma alimentação vegetariana, fui ao médico fazer um check-up. era importante compreender se não havia deficiências nutricionais, mas, sinceramente nem me recordo do que a médica me disse. lembro-me, sim, da conversa que tivemos sobre uma situação que foi descoberta.
«Tem tiroidite crónica.»
«O que é isso, dr.ª?»
«Basicamente a sua tiroide acha que a estão a atacar e cria nódulos à sua volta para se proteger.»
«E o que acontece?»
«Nada, nem precisa de fazer medicação nem nada. É só ir fazendo um controlo de 6 em 6 meses.»
lembro-me ter saído do consultório e fazer a analogia entre o que o meu corpo estava a fazer e a minha postura na vida. e com a leveza de quem tem 23 anos, lancei o assunto para o esquecimento e segui a minha vida, tentando, claramente, alterar a postura de defesa e assim fui vivendo estes 15 anos.
há 4 anos a maternidade mudou muita coisa e uma delas foi precisamente esta situação de saúde.
a tiroidite de Hashimoto (a partir de aqui referida como o "meu amigo Hashi") acordou em grande, decidida a mostrar-me que nada do que eu tinha feito nos anos anteriores tinha servido. aos poucos fui cada vez mais perdendo a minha vitalidade, chegava às 20h e estava pronta para me deitar e dormir profundamente pelo menos 9 horas seguidas. e por todo o lado, e tu também, ia ouvindo e dizendo, «é normal, tens uma criança pequena, estás a trabalhar, tens a casa para cuidar. sempre precisaste de dormir bem...» e enfim, lá me fui convencendo de que aos 30 e poucos anos era normal chegar ao fim de um dia normal, de trabalho, com um filho tranquilo, e sentir que tinha feito a maratona de Lisboa. neste estado de falta de vitalidade vais fazendo escolhas, traças prioridades, e aos poucos comecei a ver a minha esfera pessoal cada vez mais pequena, não me restava tempo para mais nada a não ser a família, o trabalho e dormir.
o corpo começou a dar mais sinais. em alguns pontos começaram a surguir inflamações. a incapacidade de concentração. a sensação constante de que tinha um nevoeiro na cabeça. a irritação por não me sentir em pleno. enfim, foi um processo que só agora, olhando para trás, é que compreendo o todo, porque enquanto estamos metidos no meio da situação, só vamos vendo um dia de cada vez. e um dia foi porque dormimos mal; o outro porque nos deram mal dormir; depois há o stress no trabalho; a menstruação... e lá vamos nós seguindo no marasmo cheio de desculpas para não acordar.
lembro-me também, perfeitamente, o dia e a hora em que se tornou claro que a situação pela qual estou a passar, não era somente aquilo que eu tinha percebido anteriormente. mas isso ficará para outro post.
é verdade, um ano depois e decidi finalmente começar a escrever sobre o que tem sido esta minha jornada com o meu amigo Hashi. é que às vezes é preciso ouvir-nos (neste caso ler-nos) para compreender o que está verdadeiramente a ser dito. no fim de semana passado ocorreu-me isso quando ouvi uma pessoa que tem glaucoma por doença autoimune, que dizia «Eu vi coisas que ninguém devia ter visto» e foi claro como a água, o glaucoma não a permite ver de um olho. por isso olhei para mim e pensei "o que digo eu sobre mim?"
mas a hesitação permaneceu mais uns dias.
é fácil, quando se fala nestes assuntos, vir a vítima falar e lá está, a minha barreira não permite que a vítima fale muitas vezes. confirmei com as minhas cartas e a resposta foi clara. portanto, aqui estou pronta para aprender mais um pouco e curar.
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