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A mostrar mensagens com a etiqueta Literatura

Sobre a beleza

Sobre a beleza o meu pai também explicava: só existe beleza no que se diz. Só existe a beleza se existir interlocutor. A beleza da lagoa é sempre alguém. Porque a beleza da lagoa só existe porque a posso partilhar. Se não houver ninguém, nem a necessidade de encontrar a beleza existe nem a lagoa será bela. A beleza é sempre alguém, no sentido em que ela se concretiza apenas pela expectativa da reunião com o outro. Ele afirmava: o nome da lagoa é Halla, é Sigridur. Ainda que as palavras sejam débeis. As palavras são objectos magros incapazes de conter o mundo. Usamo-las por pura ilusão. Deixámo-nos iludir assim para não perecermos de imediato conscientes da impossibilidade de comunicar e, por isso, a impossibilidade da beleza. Todas as lagoas do mundo dependem de sermos ao menos dois. Para que um veja e o outro ouça. Sem um diálogo não há beleza e não há lagoa. A esperança na humanidade, talvez por ingénua convicção, está na crença de que o indivíduo a quem se pede que ouça o faça po...

O inferno não são os outros

A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa. Sem ninguém no presente ou no futuro, o individuo pensa tão sem razão quanto pensam os peixes. Dura pelo engenho que tiver e perece como um atributo indiferenciado do planeta. Perece como uma coisa qualquer. Valter Hugo Mãe in A desumanização Na primeira hora de Vénus de um dia de Vénus e de S. Ricardo e S. Romualdo

A desumanização

Por serem ingénuas, as ovelhas levavam os corações puros que apenas suportavam a alegria de comerem do chão sem surpresas. Na primeira hora de Saturno de um dia de Lua e de S. Sebastião e S. Sabião

Beloved

124 was spiteful. Full of a baby's venom. The women in the house knew it and so did the children. For years each put up with the spite in his own way, but by 1873 Sethe and her daughter Denver were its only victims. Era um dia de Saturno e de S. Venceslau e S. Bernardino

Day 2 "O farol"

Wreck this Journal by spitting by Shin Tau 'No going to the Lighthouse, James,' he said, as he stood by the window, speaking awkwardly, but trying in deference to Mrs Ramsay to soften his voice into some semblance of geniality at least. Odious little man, thought Mrs Ramsay, why go on saying that? Virginia Woolf in To the Lighthouse A propósito da leitura apeteceu-me completar uma página do meu Wreck This Journal e   partilho. Na terceira hora de Mercúrio de um dia de Mercúrio e de S. Cristina, S. Francisco Solano, S. Boris e S. Godo

Aprendizagens

“Deve nutrir-se carinho por um sofrimento sobre o qual se soube construir a felicidade, repetiu muito seguro. Apenas isso. Nunca cultivar a dor, mas lembrá-la com respeito, por ter sido indutora de uma melhoria, por melhorar quem se é. Se assim for, não é necessário voltar atrás. A aprendizagem estará feita e o caminho livre para que a dor não se repita. Estava a crescer. O pescador crescia para ser um homem tremendo.” valter hugo mãe in  O Filho de Mil Homens Terminei mais uma obra de Valter Hugo Mãe, escritor português de uma criatividade incomparável,  único na forma e no conteúdo. Já lhe dediquei aqui um post e hoje apetece-me voltar a fazê-lo, já que a sua escrita me proporciona sempre grandes momentos de introspecção, de reencontro com as emoções mais puras e simples que existem dentro de mim. feelings by Shin Tau Obrigada Mãe por me recordares que é possível inventar uma família, reencontrar a força dentro de cada um oferecendo ao outro aquilo que de melhor ...

Da riqueza humana

Há uns dias atrás, num jantar animado, descobri algo muito curioso sobre a natureza humana. Partilhávamos algumas experiências literárias quando uma Gémeos de ascendente Aquário desabafou que há momentos em que não aguenta a curiosidade de saber o que se vai passar e avança as páginas necessárias para descobrir. Dizia ela que era só para aliviar a tensão que se cria em alguns momentos, voltando depois à página onde estava e continuava, descansada, a sua leitura e o prazer que ela lhe dá. Este desabafo teve em mim o efeito de uma descoberta incrível, pois, confesso, nunca me tinha ocorrido que essa possibilidade existisse. É verdade, serei eu assim tão cumpridora de regras que nunca me tenha ocorrido esta hipótese de não cumprir o esperado. E eu já li muitos livros e posso dizer que sou muuuuito curiosa. Mas esta verdade nunca me passou pela cabeça. Em verdade, recentemente aconteceu-me exactamente o oposto. Ao invés de querer descobrir o que se iria passar, parei e fechei o livr...

A Morte

Ilustração de Daniel Silvestre da Silva Não é preciso ter medo da morte, disse Batalha, com serenidade. N-não é precis... Jigajoga engoliu em seco; a sua compleição xantocromática ganhou um tom enrubescido. Por um instante, Batalha achou que ele se ia desconjuntar e ser absorvido pela terra, como uma raiz seca - até os partidários que o ladeavam, à guisa de medulas espinais suplentes, se mostraram preocupados. B-Batalha, sussurrou Caldaça, pousando uma mão no dorso. É melhor não dizeres mais nada. Porque é que dizes que não é preciso ter medo da morte?, perguntou Jigajoga, ainda desnorteado. Porque enquanto nós existirmos, a morte não existe, explicou Batalha. E quando ela existir, quem não existe somos nós. Virou-se para a assistência e disse: A morte não é como os gatos, que existem ao mesmo tempo que nós e nos podem comer. A morte só existe quando nós já não existimos, por isso não nos pode fazer mal. Acreditas mesmo nisso?, perguntou Jigajoga, tremelicante; as grandes ...

Quem canta, sua pedra levanta!

E o que é que tu descobriste ?, perguntou Batalha, referindo-se às visitas que ele fazia ao sítio da construção da igreja. O que é que tu descobriste que tens de ser? Foto de Mars Chen Descobri que sou uma pedra a meio-caminho de ser um homem , respondeu Pedranceiro, pousando os cotovelos nos joelhos. Eu ouço-os. eu sei que eles também se aperfeiçoam ao construir a igreja deles. Como é que sabes isso? Porque eles cantam ao polirem as pedras , disse Pedranceiro . E desbastam as imperfeições deles com as delas. É isso que eu tenho que fazer, mas... Curvou a cabeça. Mas ainda não sei o segredo. Às vezes, fico muito triste e acho que nunca vou aprendê-lo, mas quando me sinto mais confiante vou até à igreja e escuto tudo o que eles dizem. Não me escapa nada. Foi assim que descobri de que pedra sou feito. E passado tanto tempo, tanto que já tive oportunidade para calcorrear todas as montanhas que existem por aqui, por dentro e por fora, pude dar um nome a mim próprio. Foi um gr...

amor, perfeição, encaixe?

Pedranceiro por Daniel Silvestre da Silva Companheiros?, perguntou Pedranceiro, à espera que o cão lhe lambesse os dedos. Isso também é bom. Convém não esquecer que toda a natureza é uma única e grande irmandade. Todos os choram e sofrem e, por isso, devem sentir empatia uns pelos outros.  Isso é o que Fraca-Chicha dizia , comentou Batalha, emocionado. Quem é esse? Uma amiga que morreu, disse Batalha, baixando a cabeça e pressionando o peito com as mãos. Ainda...Ainda me dói muito. Na morte , disse Pedranceiro , sensibilizado pela tristeza da criaturinha , todos os bichos são iguais. Não há mais fortes ou mais rápidos, mais tolos ou mais sábios... Todos são iguais, todos silenciosos. A única voz que resta, capaz de falar por eles, é a nossa, a dos que estão vivos. Devemos lembrar-nos dos nossos amigos e pensar "Bem feito." Porquê  "bem feito", Pedranceiro?, perguntou Batalha, O que é que  "bem feito" significa? Quando um pedrei...

A Beleza da Vida nos pequenos momentos

O vinho fala. Toda a gente sabe isso. Olhemos à nossa volta. Perguntemos ao oráculo na esquina da rua; o conviva não convidado num banquete de casamento; ao tolo ingénuo. O vinho fala. Ventriloquiza. Tem um milhão de vozes. Solta a língua, arranca-nos segredos que nunca tencionávamos contar, segredos que nem sequer conhecíamos. O vinho berra, disparata, sussurra. Fala de coisas grandiosas, planos esplêndidos, amores trágicos e terríveis traições. Ri às gargalhadas, Ri suavemente entredentes. Chora perante o seu próprio reflexo. Abre o caminho a Verões de há muito tempo e a memórias que melhor seria esquecer. Depois de um fim-de-semana em grande, começado por um concerto magnífico e terminado com uma mensagem fenomenal, volto com algumas partilhas para fazer. Não falarei de tudo, pois há coisas que devem permanecer no interior do nosso coração a fermentar para depois poderem ser partilhada. Mas há outras que não, pois são antigas e devem ser libertas. A citação com que começo esta parti...

Crónica da Vida Social dos Ocultistas

Durante as férias li o livro que dá titulo a esta partilha do autor Luís Filipe Sarmento. É um livro que merece um comentário neste local por estar directamente relacionado com aquilo que é a actualidade espiritual neste país, provavelmente sê-lo-á em outros países, mas eu só conheço esta realidade. Enquanto romance em si, o livro tem algumas lacunas, a história sobre a personagem tem um início fenomenal, mas há medida que se vai desenrolando Guilherme, a personagem principal, vai perdendo carisma e as suas desventuras deixam de capturar a atenção e simpatia do leitor. Porém, enquanto crónica sobre a nossa sociedade esotérica não poderia ser mais divertido, acutilante e interessante. A mim, este livro trouxe-me um confirmar de várias situações e opiniões que eu já tinha, foi bom verificar que uma pessoa por quem tenho algum apreço partilha das mesmas opiniões que eu. Através do livro pude constatar que afinal é bem no centro do espiritual que se encontram as pessoas menos espirituais, ...